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Pixabay

A semana já vinha arrastada, a quinta com cara de sexta-feira antecipada graças ao feriado da Proclamação da República. Encarei a academia com a resignação de quem sabe que a velhice não pede licença pra chegar – mas a gente tenta atrasar a entrada dela na festa.

O lugar estava perfeito: quase vazio. Um ou outro maromba, as bonitonas que parecem ter saído direto dos filtros do Instagram, uma meia dúzia de batalhadores – como eu – e os equipamentos quase todos à disposição. Já tinha me livrado dos agachamentos e saí faceira do leg press, pois o treino de pernas estava quase chegando ao fim. Fui pegar o colchonete pra encarar os abdominais oblíquos e escuto o mocinho me perguntar: “A senhora vai usar esse box?”.

Eu, que já estava imaginando como seria agradável fazer atividades básicas como subir escadas ou ir ao banheiro nos próximos dias, paralisei. Foi aquela pausa dramática. A cena ao redor congelou: o som das esteiras, o vai e vem dos halteres e até a playlist animada ao fundo desafinou. No meu cérebro, veio a musiquinha do plantão da Globo seguida da manchete: “Mulher de meia idade sofre epifania ao perceber que a juventude foi oficialmente carimbada como ‘ado’”.

Senhora, essa palavra que traz na bagagem não só respeito, mas também um aviso subliminar de que você está, oficialmente, a caminho do próximo capítulo.

Senhora, eu? Eu, que me dedico pra fazer do tempo e da gravidade dois parceiros e não adversários? Eu, que estava no meu ritual quase diário em busca de um envelhecimento saudável pra um futuro bem (mas bem!!) longínquo?

Foi ali, entre os ritmados e gotas de suor escorrendo, que a ficha caiu. Não importa quantas pranchas eu segure ou quantos abdominais eu faça, o tempo não liga. Ele simplesmente a, como aquela garota que entra na sala de musculação com shortinho e um cabelo que ainda não conheceu tintura.

Eu, que só estava acostumada a ser chamada de “tia” pelo sobrinho ou pelos amiguinhos dos meus filhos, agora vou ter que engolir o “senhora”? Os homens, quando envelhecem, ganham títulos charmosos: maduro, interessante, experiente.

Na corrida contra o etarismo e a perda do colágeno as mulheres ganham, de prêmio de consolação, um pronome que parece um selo de antiguidade.

Mas o problema não é só o tempo, é como a gente carrega o peso extra que ele traz. Na contagem regressiva pros cinquenta, decidi que não vou lutar contra ele, mas transformá-lo em meu aliado, à medida do possível.

Claro que o colágeno não é mais o mesmo há tempos, a memória está me deixando na mão em diversos momentos e os espaços de lazer precisam estar vinculados a um mínimo de conforto. Quero acreditar que a alma continua jovem, apesar da carteira de identidade tentar provar o contrário.

Eu me recuso a ser peça de museu. Se o tempo quer deixar marcas, que sejam boas histórias, não rugas de preocupação. Se eu vou envelhecer, que seja dançando no ritmo da vida, mesmo que o joelho reclame no dia seguinte. 

Naquele dia, saí da academia com a certeza de que não preciso esconder minhas rugas, minhas histórias, minha idade. Eu sou senhora, sim – mas uma senhora que ainda sonha, que ri alto e está sempre buscando oportunidades de aprender, seja com a inquietude dos mais novos ou com a experiência daqueles que vieram antes de mim.

Não é um pronome que me define. É o peso que eu escolho carregar. Porque, no fundo, a luta não é contra o tempo, é contra a ideia de que o tempo nos desvaloriza. 

Danielle Blaskievicz é jornalista, empresária e não quer deixar a alma perder a vitalidade.